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Saúde Ocupacional – Quando o trabalho faz adoecer?

20 junho 2011

Saúde Ocupacional – Quando o trabalho faz adoecer

Muitas pessoas adoecem no seu local de trabalho e essa manifestação cresce a cada dia no âmbito corporativo mundial. Este artigo tem como objetivo descriminar as causas que faz o profissional adoecer e como a influência de um gestor poderá fazer a diferença na prevenção e cura deste mal coletivo.

 
1. INTRODUÇÃO

“E também que todo o homem coma e beba, e goze do bem de todo o seu trabalho; isto é um dom de Deus”. (BÍBLIA, Eclesiastes 3:13).

Palavras escritas por volta do século III a.c, muito antigas, mas inquestionáveis na definição, “Dom Divino”, que é o benefício de um trabalho bem executado.

Infelizmente vivemos uma realidade que muitos trabalhadores não conseguem gozar em plena saúde “do bem de todo seu trabalho”.

Tortura substitui a palavra dom, e volta à origem da palavra trabalho, do latim vulgar “tripaliare”, que significa torturar. Para muitos ir trabalhar tornou-se uma Odisséia diária, nada comparada a uma aventura, mas com uma rotina amarga que se prolonga por vários meses.

Esse sofrimento profundo faz o trabalhador perder seu equilíbrio emocional e físico e este termina por adoecer.

Quase sempre problemas como cobranças de um chefe exigente, péssimas condições de trabalho, falta de segurança, exposição frequente a situações de extremo desgaste (trânsito, transporte público de má qualidade, etc.), são fatores que influem diretamente na saúde do trabalhador.

Uma pessoa que acorda pela manhã para ir trabalhar com essas condições, não irá feliz e não conseguirá desempenhar um bom trabalho, dificilmente terá forças para ser pleno e realizar bem a sua função.

Este colaborador se culpa por sentir insatisfação ao ir trabalhar, afinal, quantas pessoas que estão desempregadas gostariam de estar no seu lugar. E ao sentir vergonha da sua ingratidão, tenta camuflar seu mal estar. Aguenta firme, pois o mercado de trabalho está disputado e não quer correr o risco de ficar desempregado.

O trabalhador “vai empurrando com a barriga” e consequentemente agrava mais ainda sua situação. Faz de tudo para se afirmar, exagera na intensificação de suas tarefas, quer dar conta de tudo sozinho, prefere o isolamento, como se fosse uma fuga dos seus problemas. Suas necessidades como comer, dormir e se divertir, são ações deixadas de lado. Até que em um determinado momento fica impossível sustentar tal situação e esse mal estar explode em forma de doença.

No fim da década de 60, estudiosos classificaram como Síndrome de Burnout, o ponto máximo do estresse profissional, que pode ser encontrada em qualquer profissão e desenvolvida por qualquer profissional. As discussões em torno da Síndrome de Burnout tornaram-se mais fortes nos últimos anos.

O mesmo ocorre com o Mobbing, como é denominado outro fenômeno muito discutido mundialmente. O termo Mobbing é utilizado para classificar situações de assédio moral, coação psicológica e violência emocional, uma severa forma de estresse e psicológico vivido no local de trabalho, que aos poucos faz o profissional adoecer e em muitos casos desenvolver o Burnout.

Antes que o profissional atinja o ponto máximo, é importante que o gestor identifique alguns sinais, e descubra as causas e evite que seu colaborador adoeça.

Ao preservar a integridade do trabalhador, a empresa evita também de ser um ambiente doente e de produzir gente infeliz e enferma. Ao agir pensando em seu funcionário a empresa só ganha, pois reduzem possíveis gastos com absenteísmo, licenças e gera um bem estar coletivo. Investir na qualidade de vida do funcionário valoriza a empresa internamente e externamente. Este é o agir correto, valorizar o capital humano, bens tangíveis são facilmente duplicados, mas o ser humano, não.

É dever da gestão de pessoas investir em um ambientes de alta performance, confiança aprendizado e bom humor.

Ao preservar a saúde do profissional este terá condições de usufruir com qualidade o bem de todo seu trabalho.

2. SÍNDROME DE BURNOUT E O ESTRESSE

Muitas pessoas no ambiente de trabalho acreditam que estão mal, por estarem estressadas. Segundo definição do Dicionário Aurélio: “Estresse é um conjunto de reações do organismo a agressões de diversas origens, capazes de perturbar-lhe o equilíbrio interno”. Mas quando esse estresse não tem fim, nada o faz reagir, a exaustão toma conta de todo o seu ser, oscilações de humor, distúrbios do sono, dificuldade de concentração, muitas vezes combinados com sintomas físicos, como dor de cabeça ou problemas digestivos, são sinais de que provavelmente este funcionário está entrando em “combustão”, está no seu limite físico e emocional.

A tradução mais próxima da palavra “burnout” é combustão, é o que sente realmente uma pessoa que possui essa síndrome, ela é consumida por esse fogo e fica somente o vazio. O psicanalista Herbert J. Freudenberger no início dos anos 70, constatou em si mesmo que sua atividade profissional, que tanto prazer lhe dera no passado, só o deixava cansado e frustrado. Esse fenômeno não estava acontecendo somente com ele, mas também com alguns colegas. Freudenberger passou a utilizar o termo: “To burn out”, queimar por completo, consumir-se, para definir o esse estado.

De acordo com Pellegrino Ferdinando (2000),a Síndrome Burnout é definida como: “um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional”.

Um dia ou uma semana com o ritmo acelerado no trabalho, favorece para que o colaborador chegue à exaustão, porém essa condição pode ser caracterizada como estresses, visto que são comuns dias ruins. Mas um estresse diário, exaustão sem fim que cria condições para se chegar ao limite, é considerado Burnout.

Segundo o Dr. Paulo Cesar Sousa, diretor técnico da Amil em 2010, a Síndrome de Burnout é um dos fatores que contribuem para que as empresas percam grandes talentos, pelo simples fato do departamento de Recursos Humanos não auxiliar os líderes a identificar e prevenir esse mal.

A identificação dos profissionais que estão desenvolvendo essa síndrome pode ser realizada através da observação, se o colaborador se irrita com facilidade, só reclama da vida, não está com uma boa aparência, desleixado, pouco se importa com seu marketing pessoal e esta sempre cansado, cabe ao Recursos Humanos redobrar a atenção, pois se nada mudar nas próximas semanas, é hora de identificar a causa desta mudança de comportamento, pois este é um candidato perfeito para desenvolver a Síndrome de Burnout.

O passo inicial é verificar como o líder esta se comportando em relação ao funcionário. Este é um líder muito exigente? Exige resultados através de pressão, cobrança continua?

A pressão para obter resultados é uma das principais causas deste transtorno. Na ânsia para obter bons resultados, muitos líderes exageram na cobrança e definem metas na maioria das vezes difíceis de serem alcançadas, fazendo o colaborador se desgastar e se frustrar por um resultado não atingido.

Diariamente esse tipo de pressão no trabalho faz o funcionário não se alimentar bem, perder noites de sono, ficar nervoso e sofrer por antecedência.

O profissional termina por não ter controle da sua rotina, vive em função ao trabalho, passa muito tempo longe da sua família e se priva de momentos de lazer, e mesmo depois de tanto trabalho, termina por se achar um incompetente, por não ter feito o suficiente. Mesmo cansado ele nunca irá dizer não se for exigido horas extras, tudo para provar que é capaz e de alguma forma diminuir o sentimento de incompetência.

Outra causa que colabora para o desenvolvimento do Burnout é deixar o colaborador na mesma função durante muito tempo, sem ter novos desafios e autonomia para fazer uma função diferente, que o estimule, que faça ele se sentir capaz de realizar algo diferente. De acordo com o estudo da ISMA-BR – International Stress Management Association no Brasil, os profissionais que possuem pouca autonomia para desenvolver suas atividades apresentam até 67% mais chances de adoecer.

Exposição e permanência a ambientes hostis, não favorecem o profissional, principalmente quando ele é punido ou perseguido por líderes que acreditam que a punição é uma forma de aprendizagem.

Esse comportamento é conhecido mundialmente por Mobbing.

3. MOBBING, ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO

O Mobbing é uma espécie de “Bullying” no local de trabalho, em outras palavras, é a coação psicológica e violência emocional. No Brasil o Mobbing é conhecido como assédio moral.

O Mobbing, não é considerado doença e sim uma violência que poderá fazer o profissional adoecer .

Conforme a definição da doutora Margarida Maria Silveira Barreto (2000), Médica do Trabalho, professora e pesquisadora da UNICAMP, assédio moral no trabalho:

É a exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções, sendo mais comuns em relações hierárquicas autoritárias e assimétricas, em que predominam condutas negativas, relações desumanas e aéticas de longa duração, de um ou mais chefes dirigida a um ou mais subordinado(s), desestabilizando a relação da vítima com o ambiente de trabalho e a organização, forçando-o a desistir do emprego.

Pode ser vertical, o assédio que parte dos chefes, como também horizontal, que parte dos colegas.

O Mobbing que parte dos colegas, por competição ou inveja, influência na saúde do trabalhador, mas o mais danoso é quando o Mobbing parte do superior hierárquico.

Na maioria das vezes as vitimas são funcionários tímidos, que estão vulneráveis por excesso de trabalho ou que são incapazes de se defender por medo de perder o emprego.

O agressor, no caso o líder, utiliza-se de criticas constantes, humilhações em público, ridiculariza o trabalho do profissional e nunca demonstra satisfação com nada que o funcionário faça. Guedes (2003) nós faz refletir que:

O assédio moral manifesta-se de maneira diferenciada em relação ao sexo masculino e feminino. Tal fato decorre de componentes culturais que podem ser explicados sociologicamente. Em relação às mulheres pode ocorrer em forma de intimidação, submissão, piadas grosseiras, comentários acerca de sua aparência física ou do vestuário. Quanto aos homens, é comum o seu isolamento e comentários maldosos sobre sua virilidade e capacidade de trabalho e de manter a família.

O agressor quase sempre valoriza o “dedo-duro”, estimula a competição desleal, sempre que possui oportunidade persegue o profissional e o penaliza. O líder acredita que com esse comportamento poderá manter as rédeas curtas e a situação sob controle, mas só esta colaborando com a bola de neve que não para de crescer. É comum o trabalhador assediado pedir demissão, requerer aposentadoria, afastar-se para ter um tratamento psicológico ou pior, usar drogas legais ou ilegais.

É de extrema importância que o RH identifique os líderes que utilizam esse método para atingir metas, pois o assédio moral é caracterizado como crime:

A ausência de regulamentação específica, não impede a configuração do assédio moral como ato ilícito por parte de nosso Poder Judiciário, pois adotando-se a concepção de que a prática de assédio moral agride a paz social, a dignidade da pessoa humana e a desvalorização do trabalho, é plenamente possível a aplicação de medidas judiciais que coíbam a prática do assédio moral, desde que o empregado esteja agindo na preservação de seus direitos e permeado de boa fé […]

Tramitam na Câmara dos Deputados os projetos de lei nº 4.742/2001 e nº 4.591/2001, que visam a alterar, respectivamente, o Código Penal, inserindo o artigo 146-A, que tipifica o assédio moral e estabelece a respectiva penalidade ao agente infrator.

O Projeto de Lei n° 2.369/2003 dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho. A primeira cidade brasileira a aprovar lei que condena o assédio moral foi Iracemápolis (SP). A legislação foi regulamentada em abril de 2001. Há atualmente 80 projetos em tramitação ou já aprovados nos âmbitos municipal, estadual e federal. (ABREU apud MARTINS, 2010. Disponível em: < http://maisrh.wordpress.com/2010/05/27/assedio-moral-o-que-e-e-como-evitar/>. Acesso em: 01/06/2011).

O Projeto de Lei nº 4.742 de 2001, que tramita no Congresso Nacional prevê alteração do Código Penal Brasileiro, onde deverá constar a redação:

Art. 136-A. Depreciar, de qualquer forma e reiteradamente a imagem ou o desempenho de servidor público ou empregado, em razão de subordinação hierárquica funcional ou laboral, sem justa causa, ou tratá-lo com rigor excessivo, colocando em risco ou afetando sua saúde física ou psíquica.

Pena – detenção de um a dois anos. (SPARAPANI, 2004. Disponível em: . Acesso em: 01/06/2011).

A empresa poderá pagar um valor muito alto de indenização ao assediado e o agressor poderá até ser preso, pena de um a dois anos.

O ambiente de trabalho em nenhum momento deverá ser hostil, humilhante, intimidatório e desequilibrado.

4. PREVENÇÃO E CURA

A opção mais inteligente para evitar que o profissional adoeça, é tratá-lo como único.Um gestor que trata seu colaborador como único, mesmo que possua 500 profissionais, este com certeza irá se destacar dos demais.

Na ânsia de “ter que fazer” “tenho que entregar”, muitos gestores nem conhecem seus funcionários. O relacionamento é via e-mail, em poucas linhas para não desperdiçar tempo. Cabe ao gestor de recursos humanos conscientizarem aos líderes como administrar o trabalho sem agredir o bem estar do funcionário, fazê-lo enxergar que o profissional é mais que uma matrícula um número em uma planilha. Segundo Dejours (1992):

A liberdade não se dá; ela se conquista. O mesmo acontece com relação à organização do trabalho. E provável que não exista solução ideal e que, aqui como em tudo mais, seja, sobretudo, a evolução como portadora de esperança. Considerando o lugar dedicado ao trabalho na existência, a questão é saber que tipo de homem a sociedade fabrica através da organização do trabalho. Entretanto, o problema não é, absolutamente, criar novos homens, mas encontrar soluções que permitiriam pôr fim à desestruturação de um certo número deles pelo trabalho.

Um simples bom dia, olho no olho, chamar o funcionário pelo nome, é o básico para desenvolver um bom clima na empresa. Ações simples que determinaram o tipo de funcionário que ela terá.

Atenção também ao local de trabalho oferecido ao empregado é um fator importante, ele precisa ser adequado, que proporcione proteção o contra os riscos à saúde, pois é nele que o profissional vai permanecer durante boa parte do dia.

É indispensável criar um ambiente com harmonia, higiene e segurança.

Mas nem tudo depende somente do gestor ou do local de trabalho, é necessário que o profissional também saiba como se ajudar.

Ao identificar os primeiros sintomas, cabe ao funcionário dar mais atenção a ações básicas do dia a dia, como ter uma boa alimentação, descansar, parar e fazer algo diferente da atual rotina.

Cada pessoa possui sua válvula de escape, é importante descobrir qual é a mais adequada. Utilizar a palavra “atitude”, não só como palavra, mas como ação já é o primeiro passo para desenvolver uma vida saudável, dentro e fora do trabalho. Desta forma, em nenhum momento a palavra “dom” irá ser substituída pela palavra “tortura”.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Cabe ao gestor ter uma visão global de todo processo e viabilizar práticas que favoreçam a saúde de seus profissionais. É necessário enxergar o funcionário como peça principal, reconhecendo nele primeiramente o lado humano, suas necessidades de bem-estar e de satisfação pessoal. Embutindo nele a importância de seu trabalho na organização.

Transparência, equilíbrio, criatividade, respeito e diálogo são ações fundamentais para se ter sucesso e evitar o adoecimento do colaborador e consequentemente da empresa.

Fonte: Saúde Ocupacional – Quando o trabalho faz adoecer?