Português e competitividade
José Pastore
Assisti, na sexta-feira, ao seminário Em Defesa da Língua Portuguesa, organizado conjuntamente pelas Academias Brasileira e Paulista de Letras. Acompanhei as apresentações com minha mente voltada para a notícia, publicada no dia anterior, segundo a qual o Brasil vem perdendo posições no ranking de competitividade global. Já está na 46.ª posição entre os 59 países pesquisados.
Uma das principais razões desse triste retrocesso está na má qualidade da educação e na baixa produtividade do trabalho. Nas exposições apresentadas, chamaram a minha atenção as graves consequências que decorrem da deturpação da língua portuguesa. No Brasil, uma ala crescente de professores insiste em divulgar e enaltecer o uso das corruptelas em lugar de ensinar as regras fundamentais do vernáculo. Para eles, falar certo é elitista e escrever corretamente é esnobe. Para ser do povo, é preciso falar e escrever de costas para as regras da linguagem.
É a penetração de um nefasto populismo no ambiente do ensino. Trata-se de um cenário falsamente democrático que se destaca pelo cultivo do erro e dos desvios de linguagem. Ou seja, virou politicamente incorreto seguir a gramática. Os próprios livros didáticos se afastam das normas básicas da linguagem e desorientam alunos.
Esse “politicamente correto” está causando uma grande confusão mental, para não dizer uma desorganização do espírito. Os resultados são devastadores. Basta observar o péssimo desempenho dos estudantes brasileiros no ranking internacional determinado pelos exames do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês).
O menosprezo pela linguagem adequada afeta o desempenho dos alunos nas demais disciplinas. Ninguém pode aprender bem História, Biologia, Matemática ou Física, se não dominar sua língua. Ou melhor, ninguém consegue pensar bem, se não manejar corretamente a palavra escrita e oral.
Esse é um dos maiores problemas da escola atual. A maioria dos jovens aprende, quando muito, o necessário para passar nos exames, mas não aprende a pensar.
O quadro é grave e tem reflexos ao longo de toda a vida das pessoas. Os concursos de ingresso nas carreiras públicas e os testes realizados nas empresas privadas barram 80% ou 90% dos candidatos por deficiência de linguagem. Isso mina a produtividade de toda a força de trabalho e do próprio País.
Querer vencer a corrida da competitividade nessa base é sonho de uma noite de verão. Há muito tempo se sabe que o avanço na eficiência e o progresso das nações dependem muito mais do capital humano do que do capital físico acumulado. Não há um só exemplo de país que se tenha desenvolvido sem a boa educação de seu povo.
É bom lembrar que a busca por eficiência é uma corrida em relação a um ponto móvel. A evolução das tecnologias e dos métodos de produção corre muito depressa e exige atualização constante dos trabalhadores. Para acompanhar a meteórica mudança, não basta ser adestrado. É preciso ser educado e, sobretudo, bem educado. É só com a boa educação que se consegue aprender continuamente e acompanhar a referida evolução. E não há como fazer isso sem um bom comando da linguagem. Sem isso, seremos marginalizados social e economicamente. Afinal, é a língua que explica o mundo às pessoas.
É urgente nos livrarmos do populismo defendido por atores desavisados e por corporações que menosprezam e combatem o mérito e as regras básicas do sistema de pensamento – asseguradas pela linguagem correta. O tal politicamente correto está nos colocando a caminho do economicamente ultrapassado numa hora em que os povos estão sendo desafiados a acompanhar avanços que correm a uma velocidade estonteante e jamais registrada pela história da humanidade.
José Pastore é professor da FEA-USP, membro da Academia Paulista de Letras e Presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da Fecomércio de São Paulo. www.josepastore.com.br.
Fonte: Português e competitividade
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