No Diário Catarinense: “A nova lei que regulamenta o trabalho à distância deve ser esclarecedora”
Publicada em 22 de janeiro de 2012 pelo Diário Catarinense.
A nova lei que regulamenta o trabalho à distância deve ser esclarecedora, e não se prestar a interpretações radicais e tampouco contribuir para a insegurança jurídica e oportunismos.
O país tenta decifrar, há um mês, o real alcance da nova Lei 12.551, que regulamenta o que genericamente se define como trabalho à distância e tem a intenção de atualizar a legislação do setor à evolução das tecnologias. Como toda evolução, também essa será bem-vinda se cumprir com o princípio básico de que uma norma legal deve ser clara e objetiva. Até agora, pelas reações provocadas, a novidade vem demonstrando seu poder de também confundir. Não é um bom sinal, num país com fartura de leis confusas e elaboradas às pressas, que se prestam, pela própria controvérsia que provocam, muito mais a perturbar do que a elucidar.
Diz a lei que se extingue a distinção no trabalho realizado no estabelecimento do empregador, no executado no domicílio do empregado e no realizado à distância. Assim, as formas que utilizam as telecomunicações ou a informática para estabelecer contatos de trabalho passam a se equiparar aos contatos pessoais e diretos entre chefes e subordinados. Numa primeira leitura, parece que a mudança na Consolidação das Leis do Trabalho cumpre de fato o objetivo de modernizar uma legislação de 1943. As formas de comunicação proporcionadas por telefones móveis, computadores, tablets e outros meios virtuais de contato devem de fato ser contempladas pelas leis no que se refere às relações de trabalho. Cada vez mais, algumas atividades profissionais são exercidas na residência dos trabalhadores e em muitas outras a comunicação direta e pessoal não é predominante.
Até aí, aparentemente, não há o que contestar. As interpretações conflitantes, que vêm sendo manifestadas por advogados e especialistas em legislação trabalhista, abordam questões subjetivas, como o contato eventual de um empregado, depois da jornada prevista, com superiores ou colegas de trabalho. É evidente que a lei não pode se prestar a concepções exageradas e contribuir para a insegurança jurídica, ao permitir uma interpretação enviesada do que se propõe disciplinar. É claro também que o aumento das possibilidades de comunicação e o uso crescente dos meios virtuais fazem com que todos e não só empregadores e empregados sejam estimulados a contatos mais frequentes. A potencialização desses recursos torna praticamente impossível que, em muitos setores, as pessoas não troquem, esporadicamente, informações de trabalho depois da jornada convencional.
É absurdo supor, como pretendem alguns intérpretes da legislação, que um e-mail ou um torpedo por celular, eventualmente despachados por um funcionário, fora do expediente ou num fim de semana, poderão caracterizar hora extra, se tiverem qualquer assunto de trabalho como motivação. Há, nessas interpretações mais radicais da nova lei, indícios de que certos setores pretendem apontar qualquer contato virtual como trabalho extra. Seria contraproducente, em todos os sentidos, que a Justiça adotasse uma interpretação demasiadamente ampla da mudança. Não é o que espera de quem terá a última palavra.
O Brasil já conviveu com períodos de instabilidade nas relações trabalhistas e até com decisões questionáveis do Judiciário. A expectativa é de que, como ocorre há muito tempo, continue prevalecendo o bom senso. A CLT, que exige outros aperfeiçoamentos para se adequar aos novos tempos das relações de trabalho, é um instrumento, como definiu um juiz paulista, a serviço da primazia da realidade. E a realidade é que uma legislação modernizadora e bem-intencionada não pode se prestar a confusões e oportunismos.
Fonte: No Diário Catarinense: “A nova lei que regulamenta o trabalho à distância deve ser esclarecedora”
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