Acidentes em obras expõem falta de segurança e de fiscalização
Dois grandes acidentes no segmento da construção civil marcaram o mês de agosto no Brasil. Um deles, no Nordeste, resultou na morte de nove operários e o outro, no Sul, causou o soterramento de 11 trabalhadores, com duas vítimas fatais. Sindicalistas e especialistas ouvidos pela Proteção afirmam que os principais pontos a serem questionados são a fiscalização e o planejamento de segurança.
“O planejamento de segurança deve estar atualizado. Toda obra tem riscos, mas deve haver uma avaliação das áreas de risco e investimento na proteção”, orienta o presidente do STICC POA-RS (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de Porto Alegre), Valter Souza.
Para Carlos Alberto Matos Vieira Lima, presidente do Sindicato da Indústria da Construção do Estado da Bahia (Sinduscon-BA), a conscientização é a melhor forma de prevenir acidentes. “Precisamos educar tanto as empresas quanto os trabalhadores para reduzir os acidentes e doenças”, afirma.
Salvador
No dia 9 de agosto, em Salvador (BA), um dos elevadores utilizados na construção do edifício empresarial Paulo VI desabou de uma altura de aproximadamente 80 metros, matando na hora os nove operários que estavam dentro do equipamento. Segundo o laudo preliminar, um rompimento do eixo do motor causou a queda e o não funcionamento do sistema de frenagem.
O chefe do Setor de Segurança e Saúde do Trabalhador (SEGUR) da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego na Bahia (SRTE/BA), Flávio Oliveira Nunes, garante que a obra havia sido fiscalizada em maio e as irregularidades encontradas foram corrigidas, mas a obra avançou e novos problemas surgiram.
“Para prevenir o acidente, a empresa deveria ter feito um ensaio deste eixo do motor para verificar se havia fissuras e, ainda, realizado testes no sistema de frenagem, que deve ser feito a cada 30 dias”, aponta. Segundo ele, de junho de 2010 a junho de 2011 foram interditados 200 elevadores e mais de 150 obras foram embargadas em Salvador e na região metropolitana.
A Construtora Segura, responsável pela obra, afirma estar colaborando com as investigações. Reforça que o elevador de uso de engenheiros e colaboradores funcionava dentro das normas técnicas e que a obra era fiscalizada com frequência pelas autoridades competentes.
Porto Alegre
Já em Porto Alegre (RS), no dia 27 de agosto, a laje de cobertura da obra de construção de uma estação de bombeamento de esgoto na zona sul da cidade estava sendo concretada quando desabou. Dos 11 operários que trabalhavam no local, nove foram resgatados com vida e dois não sobreviveram. A obra, realizada pela construtora Marcos Projetos e Construções, é de responsabilidade do Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE).
As causas do acidente ainda são desconhecidas. O auditor fiscal da SRTE/RS (Superintendência Regional do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul), Luís Rossi Bernardes, diz que é muito cedo para uma conclusão e que a investigação é complexa. O canteiro de obras foi embargado e a construtora pode trabalhar apenas para se adequar às exigências.
Segundo a assessoria de comunicação do DMAE, trata-se de um acidente estrutural. Após o término das investigações, a empresa tomará as medidas administrativas e jurídicas cabíveis, enquanto contratante da executora da obra.
Medo
Em ambas as obras, havia uma preocupação por parte dos trabalhadores com os riscos que corriam. “Eles já tinham percebido problemas no elevador, mas mesmo assim o utilizaram. Não se negaram a subir”, relata o diretor de saúde do Sintracom-BA (Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Construção e da Madeira no Estado da Bahia), Arilson Ferreira dos Santos.
“Ouvimos dos trabalhadores que havia uma preocupação com os riscos que corriam na obra. Notamos que estavam muito apreensivos”, conta Valter Souza sobre a segurança na obra do DMAE.
Fiscalização, manutenção e planejamento
Segundo Souza, do STICC POA-RS, profissionais mais qualificados no planejamento da segurança são fundamentais para a prevenção de acidentes. “Engenheiros e técnicos deveriam estar participando ativamente de uma concretagem como a que é realizada nesta obra”, aconselha, referindo-se à laje de cobertura da construção do DMAE.
O Sinduscon-BA, em parceria com outros órgãos, propõe que os projetos de Saúde e Segurança sejam mais uma condição para a liberação dos alvarás das obras, “dando-lhes a mesma importância que se dá a projetos estruturais e arquitetônicos”, defende o presidente Carlos Alberto Lima.
O engenheiro de Segurança do Trabalho e integrante da Comissão de Política e Relações do Trabalho do Sinduscon-RS, Sérgio Ussan, concorda que o planejamento é uma das melhores formas de prevenção. “As empresas devem ter suas próprias equipes com técnicos e engenheiros de segurança e uma auditoria externa e isenta que aponte as não conformidades na obra, para que seja feito um bom planejamento de segurança”, enfatiza.
A fiscalização é outro fator importante para garantir a integridade dos trabalhadores da construção civil. No entanto, a quantidade de auditores fiscais é pouca para tantas obras a serem fiscalizadas, de acordo com o Sintracom-BA.
O chefe da SEGUR confirma o problema na Bahia. “Temos apenas 12 auditores para fiscalizar as construções de Salvador e da região metropolitana. É impossível visitar todas as obras”, lamenta.
O especialista Sérgio Ussan afirma que o Ministério do Trabalho precisa de, no mínimo, o dobro de fiscais que tem hoje, mas essa obrigação não é apenas da Pasta e, sim, de três esferas: “Da empresa, que é a responsável civil e criminal pelo equipamento; do Ministério do Trabalho, responsável por controlar e avaliar se a empresa cumpre seu dever; e dos sindicatos, que devem acompanhar a atividade dos trabalhadores”, enumera.
Ações
Após o acidente em Salvador, a SRTE/BA organizou uma força-tarefa para vistoriar os elevadores, visitando 44 canteiros de obras. Destes, 10 foram embargados e 63 elevadores foram interditados até o fechamento da matéria.
O Comitê Permanente Nacional sobre Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção, por sua vez, decidiu, no dia 1º de setembro, alterar a NR 18 para que os elevadores a cabo não possam mais ser utilizados em obras para transportar trabalhadores, a partir de maio de 2013.
O Sintracom-BA, por meio de uma campanha de prevenção, recomenda que os elevadores não sejam utilizados se ainda não foram fiscalizados. “O problema é que os empresários estão mais preocupados com o custo de um elevador de qualidade e da manutenção do que com a vida dos operários”, reclama Arilson dos Santos.
O STICC POA também pretende realizar uma campanha de conscientização. “Faremos um apelo para o cuidado com a vida dos trabalhadores, fornecimento de EPIs, treinamento e cumprimento das normas regulamentadoras para a prevenção”, finaliza Valter Souza.
Fonte: Acidentes em obras expõem falta de segurança e de fiscalização
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